A mesma São Paulo que repercutiu no mundo inteiro com avanços históricos nos últimos anos enfrenta agora uma possibilidade de retrocesso imensurável. Em fevereiro deste ano, foi aprovado pela Câmara de São Paulo um novo mecanismo legislativo (revisão da Lei de Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo, popularmente conhecida como Lei de Zoneamento), cujo artigo 174 flexibiliza pelos próximos três anos duas das principais características do Plano Diretor Estratégico da cidade de São Paulo (PDE-SP). A nova Lei de Zoneamento, que ainda precisa ser sancionada pelo prefeito Fernando Haddad, irá permitir a construção de mais vagas de garagem nos chamados eixos de transporte (vias dotadas de metrô e corredores de ônibus), sem a necessidade de outorga onerosa para o setor imobiliário.
Dentre as principais propostas do novo PDE-SP, a eliminação de número mínimo de vagas de estacionamento para novos empreendimentos em toda a cidade, fez dela a primeira megalópole a adotar essa medida em toda a sua extensão, que serve como medida de desistímulo de uso do automóvel e incentivo ao uso de meios de transporte mais sustentáveis. Além disso, limitou o número máximo de vagas por empreendimentos em determinadas regiões da cidade, dentre outras medidas que estimulam o adensamento e desenvolvimento urbano de forma orientado ao desenvolvimento ao transporte.
O novo PDE busca humanizar e reequilibrar São Paulo, aproximando moradia e emprego e enfrentando as desigualdades socioterritoriais. Aprovada e sancionada em julho de 2014, a revisão do PDE (Lei nº 16.050/2014) foi realizada de forma participativa e traz uma série de diretrizes para orientar o desenvolvimento e o crescimento da cidade pelos próximos 16 anos.
Esse novo Plano, mais do que tudo, é fundamental para tentar reverter a crise de mobilidade que assola São Paulo, trazendo esperança aos cidadãos e reconhecimento internacional. “Estamos vivendo uma crise de mobilidade, e Plano Diretor de São Paulo apresenta estratégias e mecanismos concretos para tentar mudar esse quadro. Não vamos conseguir melhorar a qualidade de vida e o bem estar em nossas cidades se não pensarmos transporte, emprego e moradia de maneira completamente indissociável, reforça Ana Nassar, diretora de programas do ITDP Brasil.
Diversas organizações da sociedade civil organizada estão se mobilizando e pedindo ao prefeito que vete este artigo. O ITDP Brasil se manifesta a favor do veto do artigo 174 na nova Lei de Zoneamento da cidade de São Paulo, cujo teor considera um enorme passo atrás na direção de uma São Paulo mais justa, sustentável e humana, tendo apoiado a campanha #HaddadVeta174.
Além disso, a partir de uma revisão da íntegra da nova Lei de Zoneamento, a equipe do ITDP Brasil identificou pontos sensíveis associados ao processo de aprovação da nova lei de zoneamento, e propõe algumas recomendações para minimizar os riscos e incertezas em relação à conquistas importantes do PDE-SP. Os principais pontos da análise independente do ITDP Brasil são relacionados à consolidação do processo de planejamento participativo no desenvolvimento dos demais instrumentos da política urbana do município.
O processo de planejamento participativo no desenvolvimento do PDE-SP foi inovador no contexto das grandes cidades brasileiras. Porém, este precisa ser consolidado em relação à elaboração dos outros instrumentos que compõem a política urbana de São Paulo (Zoneamento Urbano, Código de Obras e Edificações, Planos Regionais das Subprefeituras e Planos de Bairro), visando legitimar e estimular a adesão pública em torno de suas propostas.
A alteração da Lei Nº 272/2015 (LPUOS) a partir de emendas encaminhadas pelo poder legislativo posteriormente a sua aprovação, contemplando inclusive temas que afetam conquistas importantes do PDE-SP (número máximo de vagas e cota parte máxima de terreno nos Eixos de Estruturação da Transformação Urbana), enfraquecem o caráter participativo do processo e criam indefinição sobre manutenção de avanços relacionados à promoção da mobilidade sustentável.
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Em 25 de fevereiro de 2016, finalmente foi aprovada a nova Lei de Zoneamento (Lei 16.402/16) que se encontra atualmente em vigor na cidade de São Paulo. Todo o material relativo à nova lei está disponível na plataforma Gestão Urbana, e a partir da segunda quinzena de abril de 2016, também estará disponível no portal Geosampa. O artigo 174 foi mantido, e dispõe que durante o período de 3 (três) anos após a entrada em vigor desta lei, aplicam-se os seguintes incentivos na zona ZEU: I – a cota parte máxima de terreno por unidade residencial será igual a 30m²/un (trinta metros quadrados por unidade residencial); II – no disposto na alínea “a” do inciso I do art. 62 desta lei, fica admitida 1 (uma) vaga a cada 60m² (sessenta metros quadrados) de área construída computável da unidade. A vigência dos incentivos previstos neste artigo será improrrogável.