Durante duas décadas, o pesquisador de transportes Daniel Chatman desenvolveu um estudo sobre o deslocamento das pessoas de casa para trabalho e seus impactos para as economias metropolitanas. Tendo como base o contexto americano, Chatman investigou padrões de tráfego, distribuição das oportunidades de emprego e subsídios para financiamento de moradia em bairros de alta densidade com bom acesso ao transporte público. Em 2013, seus estudos apontaram que o trânsito poderia produzir até 1,8 bilhões de dólares anuais em benefícios econômicos para as cidades.
Daniel Chatman será um dos palestrantes no MOBILIZE Santiago, evento que acontecerá na capital chilena em junho, encontro com foco em transportes, que contará com a participação diversas organizações, representantes do poder público, pesquisadores e estudantes de diversas partes do mundo. O pesquisador vai falar sobre desenvolvimento urbano e cidades dinâmicas, incluindo políticas de habitação social e a integração (ou ausência) e acesso no transporte público.
O ITDP conversou com Chatman no escritório da Universidade de Berkeley, na Califórnia. Chatman é professor no Departamento de Planejamento Urbano e Regional e nos falou sobre seu trabalho e também sobre o tema do MOBILIZE deste ano, “cidades justas e inclusivas tornam-se o novo normal”.
Confira a entrevista:
ITDP: Sua pesquisa mostrou que o transporte pode permitir maior adensamento das cidades e, portanto, maior produtividade devido às economias de aglomeração. As cidades americanas finalmente despertaram para esses benefícios?
Planejadores americanos estão sendo treinados para acreditar que o crescimento inteligente e o transporte público são ideias excelentes, no entanto, as cidades não necessariamente acreditam que isso é totalmente verdade. As cidades não acreditam porque as pessoas não acreditam, e isso não acontece só porque as pessoas têm suas próprias preocupações, mas porque elas estão olhando para o impacto imediato de vários tipos de financiamento e decisões de investimento, e esses são impactos acontecem, em muitos casos, ao nível do bairro. Em alguns casos, as pessoas acreditam e estão dispostas a aceitar enormes aumentos de impostos no comércio, como por exemplo, em lugares como Los Angeles e Seattle.
E, no entanto, se esse apoio acaba se traduzindo em verdadeiras grandes mudanças na densificação das cidades e no número de passageiros em todos os modos, essa é uma questão separada. Temos uma série de regulamentações que impedem a realização desses benefícios.
O fato é que, sim, nos Estados Unidos, temos maior produtividade em cidades mais densas com melhores sistemas de transporte público. Mas se você olhar para essas cidades, você também vai perceber uma crescente polarização da renda. Temos ambas as coisas, em parte, porque a habitação é realmente cara nesses mesmos lugares.
Os planejadores tendem a estar atentos porque acreditam no poder das cidades. Mas às vezes nossa visão de cidades bonitas com grandes comodidades pode correr o risco de ser uma visão mais voltada para pessoas de alta renda, então é preciso ter cuidado com isso.
Como podemos convencer as cidades de que repensar o uso do estacionamento é uma das melhores maneiras de melhorar a equidade nas cidades?
Os requisitos mínimos de vagas de estacionamento em edificações aumentam o custo da habitação, especialmente em ambientes densos. Não é incomum ver nas cidades americanas que os custos de construção para estacionamento podem chegar em até 60 mil dólares por vaga, isso é muito dinheiro.
Esses requisitos são uma questão de equidade por causa do custo da habitação, mas eles são realmente mais perniciosos do que isso, porque eles mudam o tipo de habitação que é desenvolvido em primeiro lugar. As incorporadoras são mais propensas a construir habitação de luxo devido à exigência de ofertar duas vagas de estacionamento por unidade.
Há alguma evidência de que as exigências de estacionamento em alguns lugares são uma restrição maior na densificação do que qualquer outra coisa. Ou seja, não é o limite de gabarito, a alocação do zoneamento existente, ou os índices de aproveitamento, é o estacionamento que impede que as pessoas se desenvolvam tão densamente quanto elas necessitem.
Que tipo de impacto você acha que o financiamento federal, ou a falta dele no clima político atual, terá no planejamento de transporte nas cidades dos EUA e como avançar independente disso?
Existem muitas cidades que já estavam avançando sem contar com financiamento federal, e que agora representam uma fração menor de todos os novos projetos. Mesmo que eu seja um crítico de como os projetos de transporte público foram financiados pelo governo federal, não acredito que colocar todo o dinheiro em estradas seja uma boa solução.
O clima político atual vai ter um impacto negativo na sustentabilidade das cidades. Por exemplo, o governo Trump estava considerando um trilhão de dólares de infraestrutura do Departamento de Transportes que publicou uma lista de 50 slides de projetos em potencial. A maior parte era dedicada para manutenção e construção de infraestruturas rodoviárias. Eu não acho que isso seja positivo e que vai ter um impacto tão grande como poderia ter há 20 anos, por causa do fato de que as cidades estão procurando fontes alternativas de financiamento e estão cada vez mais dependentes deles.
Em última análise, as cidades menores serão as que sentirão mais, porque são as cidades maiores e os estados mais ricos que vão fugir com esses tipos de aumentos de impostos que financiam o transporte. As áreas periféricas sofrerão mais.
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