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Estudo inédito aponta como considerar a realidade brasileira para financiar a mobilidade urbana

Vivemos uma crise no acesso ao transporte que se iniciou há décadas, afetando negativamente a qualidade de vida da população brasileira. O modelo de desenvolvimento urbano promovido no país concentrou as oportunidades de acesso, cultura e lazer nas áreas centrais das cidades – onde residem as pessoas ricas e em sua maioria autodeclaradas brancas. Esse modelo também foi responsável pela priorização de investimentos para o deslocamento de veículos particulares, como carros e motos, em detrimento de modos sustentáveis – como o transporte público, a mobilidade a pé e por bicicleta. Enquanto isso, a maior parte da população brasileira, que é negra e pobre, mora longe dos centros urbanos, das oportunidades, e se desloca principalmente por um transporte público escasso e com baixa qualidade, que não recebe subsídios públicos. 

Foto: ITDP Brasil

Com a pandemia, essa crise foi agravada. Como são as que mais precisam utilizar o sistema de transporte por ônibus, as pessoas negras, pobres e periféricas também são as que pagam por boa parte – senão todos – dos custos do transporte , uma vez que a tarifa é a principal fonte de recursos dos sistemas de ônibus em muitas cidades brasileiras. Com a chegada do novo coronavírus, a NTU calcula uma redução de  80% na quantidade de pessoas se deslocando por esse meio de transporte. Como se não bastasse lidar com a falta de estações de transportes próximas às suas casas, enfrentar horas de deslocamentos em condições precárias de circulação, estar suscetível à violência durante os trajetos e ainda ter parte da renda comprometida para acessar à cidade, as pessoas ainda enfrentam a diminuição da quantidade de veículos circulando e o aumento do tempo de espera nos pontos de embarque. 

Por isso, mais do que nunca, há uma urgência para encontrar novas formas de financiamento para manter a sustentabilidade financeira dos serviços de transporte, garantindo a qualidade ao serviço. 

Encontrar medidas que financiem o transporte público e garantam sustentabilidade e qualidade para a população brasileira requer considerar as desigualdades existentes – principalmente sociais, econômicas e raciais.

Com base neste cenário, o Instituto de Políticas de Transporte e Desenvolvimento (ITDP Brasil) lança o estudo Desafios e soluções para a gestão equitativa da mobilidade no Brasil com o objetivo de ampliar o debate sobre as estratégias de gestão da mobilidade, como políticas de estacionamentos e medidas de precificação sobre a circulação de veículos poluentes. O principal foco das estratégias – já adotadas em diversas cidades do mundo –, é desestimular o uso de automóveis e expandir as fontes de receitas para estimular o uso de modos de transportes mais eficientes e sustentáveis. A originalidade do estudo se dá por trazer uma perspectiva cuidadosa para as discussões, que não podem dificultar a mobilidade das populações periféricas ou reforçar a segregação socioterritorial observada no Brasil.

O que são medidas de gestão da mobilidade?

A escassez de recursos internos nos sistemas de transporte público, exacerbada ainda mais pela pandemia, requer a diversificação e ampliação de receitas. Algumas das estratégias utilizadas em outras cidades do mundo consistem em tarifar e/ou taxar automóveis e motocicletas, reinvestindo os recursos no transporte público coletivo e ativo. 

Essas medidas ampliam a consciência dos motoristas sobre os custos do uso do automóvel. Para mais informações sobre o tema, acesse o estudo Gestão da mobilidade para cidades inclusivas.

Como as estratégias existentes podem impactar a realidade das cidades no Brasil

A mera replicação das medidas que funcionam em países no Norte global no Brasil pode aumentar ainda mais as desigualdades locais. O estudo aborda esses desafios e apresenta exemplos nacionais bem-sucedidos, que demonstram a viabilidade, os caminhos e os benefícios dessas medidas para todas as pessoas. 

A publicação também conta com levantamentos bibliográficos, dados e indicadores, além de entrevistas realizadas com especialistas de diferentes áreas de atuação engajados na temática da mobilidade urbana. De acordo com a pesquisa, os fatores a serem considerados no Brasil são:

A CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DAS CIDADES, já que os subúrbios brasileiros se diferem dos localizados no Norte global, que possuem os centros resididos em sua maioria pela população mais pobre. No Brasil, a implantação de políticas tarifárias aplicadas igualmente a todos os veículos afetaria principalmente a população suburbana e periférica, que já lida diariamente com a falta de transporte público, infraestrutura e investimentos de forma geral.

OS PRIVILÉGIOS EXISTENTES. As estruturas de mobilidade no Brasil garantem privilégios e maior acesso a grupos ricos e autodeclarados brancos, que têm maior oferta de sistemas de transporte próximas às suas casas. Esses grupos também têm a maior posse de veículos particulares.

QUESTÕES DE GOVERNANÇA. Os aspectos políticos, observados tanto em escala nacional quanto municipal podem dificultar a adesão a políticas de caráter redistributivo nas mais diversas áreas, contribuindo para a manutenção da hierarquia social.

CUSTOS MONETÁRIOS, FÍSICO E MENTAL. A população mais pobre passa mais tempo no transporte público e é quem custeia a maior parte do sistema. Além da questão financeira, o transporte também causa exaustão física e mental durante os deslocamentos. Nesse sentido, medidas que aumentem a tarifação para a população com renda mais alta podem auxiliar a corrigir essas distorções.

CULTURA DO AUTOMÓVEL E FALTA DE OPÇÕES SUSTENTÁVEIS PARA SE DESLOCAR. A baixa oferta de transportes públicos confiáveis, confortáveis, ágeis e convenientes faz dos veículos particulares a primeira opção para deslocamentos. No caso das famílias pobres, utilizar um veículo particular pode ser a opção mais digna para acessar a cidade, ainda que adquirir um carro próprio seja oneroso ou cause endividamento. Considerando as poucas opções atraentes para a população periférica, as estratégias de precificação podem reduzir (ainda mais) a capacidade de circulação.

As medidas de gestão da mobilidade precisam ser equitativas, impedindo que reduzam ainda mais a capacidade de circulação de pessoas negras e pobres

Com base neste cenário desafiador, o estudo apresenta soluções potenciais para o Brasil tornar de fato a mobilidade urbana um direito social e efetivo, considerando aspectos particulares da realidade local. Para que isso aconteça, estratégias para arrecadação de recursos para financiar a mobilidade sustentável precisam garantir que as pessoas mais pobres não sejam oneradas. Além disso, as soluções não devem ser pensadas somente no âmbito do setor de transportes. Entre as propostas apresentadas, estão:

FORMAS PARA SUBSIDIAR A MOBILIDADE, como a partir da criação do Sistema Único de Mobilidade Urbana (SUM) e da tributação de aplicativos de transporte.

ESTIMULAR O USO E INVESTIMENTO NO TRANSPORTE PÚBLICO a partir de mudanças na metodologia do vale-transporte, equilibrando o investimentos em transporte público e privado e explorando a publicidade nos veículos.

GERIR O TRANSPORTE INDIVIDUAL MOTORIZADO a partir de medidas de gestão de estacionamento, precificação pelo uso do espaço viário de acordo com o tipo de veículo, destinando recursos oriundos de multas para modos sustentáveis.

FOMENTAR E INVESTIR NO TRANSPORTE ATIVO por meio da integração com estações de transporte de média e alta capacidade e promovendo espaços seguros para que as pessoas pedalem.

CRIAR NOVAS CENTRALIDADES: aproximar os locais de moradia às oportunidades urbanas a partir do fortalecimento de novos centros.

ADMINISTRAR A PROPRIEDADE DA TERRA EM ÁREAS URBANAS, aplicando taxas em estabelecimentos comerciais e diferentes alíquotas de IPTU conforme os padrões das residências.

Para colaborar com o desenvolvimento de estratégias locais, são também incluídos exemplos brasileiros bem-sucedidos de estratégias de gestão da mobilidade, como os sistemas de estacionamento rotativos em Fortaleza (Zona Azul Digital) e em São José dos Campos (Zona Azul Eletrônica), e a taxação do transporte por aplicativo em São Paulo. Os casos ajudam a entender como as características sociais e territoriais devem compor o bojo das estratégias embasadas em boas práticas internacionais, uma vez que o contexto nacional impõe desafios diferentes em cada localidade.

Nesse sentido, a identificação de desafios potenciais para as cidades brasileiras é uma ação necessária por permitir uma avaliação crítica e ajustes das estratégias adotadas em outros países. No Brasil, as políticas devem ter caráter redistributivo e podem servir para o financiamento (ou como recurso acessório) dos modos sustentáveis. 

Evento de lançamento

Para o lançamento do estudo, convidamos a Multiplicidade Mobilidade Urbana e o Instituto de Estudos Socioeconômicos para debater que aspectos da realidade brasileira devem ser considerados nas políticas de tarifação dos automóveis para não tornar a mobilidade ainda mais excludente, especialmente para pessoas pobres e negras. Assista ao evento na íntegra: 

 

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