Com uma pandemia global interferindo diariamente na rotina das pessoas, muitas coisas estão mudando - inclusive a maneira como estamos nos deslocando. Com o objetivo de ajudar as cidades a definirem suas infraestruturas e fortalecer diversos modos de transporte, o ITDP apresenta a definição de micromobilidade.
No momento em que esse texto é escrito, o novo coronavírus (COVID-19) está interferindo na rotina das pessoas de diferentes formas, inclusive restringindo não somente as viagens diárias feitas por lazer, mas também as que são realizadas de casa para o trabalho. Enquanto a maioria das recomendações limitam os deslocamentos, a possibilidade de optar por modos de viagens confiáveis e acessíveis importa mais do que nunca.
A cidade de Nova Iorque, por exemplo, está abrindo mais espaços para os ciclistas e para os usuários da micromobilidade nas ruas com o objetivo de apoiar o aumento repentino no uso dos modos de transportes individuais nos deslocamentos de curta distância. Em Bogotá, na Colômbia, foram adicionados 76 quilômetros de ciclovias praticamente do dia para noite com a finalidade de acomodar mais ciclistas e manter o distanciamento social recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Cidade do México e Londres estão percebendo os benefícios de anos de investimento na expansão da rede cicloviária e estão trabalhando para tornar permanentes as medidas temporárias dedicadas aos ciclistas. Curiosamente, há histórias em todo lugar de pessoas que repensaram as viagens e optaram por utilizar bicicletas e patinetes onde esses modos estão disponíveis.
Essa questão importa não apenas para a situação provocada pela disseminação da COVID-19, mas também para a resiliência geral de uma cidade. Seja durante uma pandemia global, ou por conta de tempestades severas, em vista da má qualidade do ar ou devido aos outros efeitos das mudanças climáticas, as cidades continuarão sendo confrontadas e terão que encarar os desafios com medidas que promovam adaptação. Para manter as cidades em movimento, é preciso oferecer todas as opções disponíveis: ônibus, metrô, táxis compartilhados, caminhadas e, é claro, a micromobilidade, que deve fazer parte do plano de resiliência de todas as cidades.
Essa pandemia ajuda a perceber que os veículos leves, como a bicicleta, são importantes e nos permitem andar pela cidade com segurança e resiliência.
O que é micromobilidade?
Micromobilidade é um termo que recentemente passou a ser utilizado por urbanistas, planejadores e também no mundo da tecnologia. No entanto, não há um consenso sobre o que realmente significa micromobilidade. O ITDP, em consulta com a comunidade de transporte sustentável, desenvolveu uma definição de micromobilidade que descreve a crescente família de veículos pequenos e leves que operam em velocidades abaixo de 25 km/h e são ideais para deslocamentos de até 10 km de distância. A micromobilidade pode ser individual ou compartilhada; elétrica ou manual. No entanto, veículos com velocidades máximas acima de 45 km/h ou aqueles movidos por motores a combustão interna não são classificados como micromobilidade. Motocicletas e ciclomotores, por exemplo, não estão incluídas nesta definição. Em vista da popularização desses veículos, essa definição deve incluir os modos atuais e outros que venham a surgir no futuro.
Sem uma definição consensual de micromobilidade, as cidades têm se esforçado para padronizar regulamentações de diferentes veículos. Organizações como a Society for Automotive Engineers (SAE) e o International Transport Forum (ITF) desenvolveram abordagens para categorizar os veículos de micromobilidade com base no peso, velocidade e potência. O conceito do ITDP se baseia nesses esforços, mas fornece uma definição clara e direta de micromobilidade que pode ser usada e compreendida por pessoas de diferentes áreas, como órgãos reguladores, jornalistas e o público em geral. Adotar uma definição permite que as cidades criem diretrizes para utilizar a infraestrutura dedicada às bicicletas, que deve ser adaptada e expandida para acomodar os veículos de micromobilidade. A infraestrutura cicloviária deve acomodar somente veículos de micromobilidade com velocidade máxima de 25 km/h, excluindo os veículos de velocidades mais altas, como ciclomotores e motocicletas.
A ideia das vias segregadas para a micromobilidade tem ganhado popularidade e busca acomodar outros veículos leves, além das bicicletas. Consistente com a definição de ciclovia, as vias segregadas para a micromobilidade separam fisicamente os usuários de bicicletas, patinetes e outros veículos leves do tráfego de automóveis nas ruas e dos pedestres nas calçadas. Cidades americanas, como Atlanta e Portland, adotaram esse termo, e organizações como o Fórum Internacional de Transporte (ITF) têm insistido por definições mais claras para essas vias.
Nas cidades mais populosas do mundo, a maioria das viagens já é feita a pé, de bicicleta e de transporte público. Muitas cidades da Índia, por exemplo, têm menos de 10% das viagens feitas de carro. Elevar a prioridade dos modos de micromobilidade oferece às pessoas outra alternativa ao veículo particular, principalmente se ele estiver integrado a outros modos de transporte e for acessível para todos.
Não podemos perder a oportunidade de priorizar os transportes ativos e a micromobilidade enquanto combatemos as crises globais de saúde pública, mudanças climáticas e segurança no trânsito. Esta é a hora das cidades responderem aos desafios que estamos vivendo, construindo infraestrutura e abrindo espaços em nossas ruas para acomodar os usuários de micromobilidade. Essa mudança deve acontecer em conjunto com a implementação de políticas públicas que mantenham os usuários seguros e incentivem mais pessoas a mudar seus modos de locomoção.
Por que micromobilidade é importante?
As cidades estão cada vez mais densas e povoadas, e a previsão é que esse crescimento seja contínuo. A Organização das Nações Unidas (ONU) prevê que mais da metade da população mundial more em cidades até 2050. Nesse sentido, mais pessoas precisarão de acesso a serviços de mobilidade flexíveis, confiáveis e acessíveis para diferentes tipos de viagens. Precisamos considerar que as cidades não possuem espaço suficiente para mover e estacionar carros particulares para todos os moradores, e que os congestionamentos existentes já colaboram para que outros modos de transporte sejam utilizados nos horários de pico. Além disso, não podemos desconsiderar o impacto negativo que o uso do carro tem para a segurança viária e qualidade do ar.
Precisamos repensar as paisagens urbanas adaptando-as às novas necessidades de mobilidade dos moradores. Isso significa criar espaços funcionais e seguros para usuários que não utilizam automóveis, como pedestres e pessoas que usam bicicletas e patinetes. Para distâncias de até dez quilômetros, a micromobilidade é uma ótima oportunidade para deslocamentos rápidos, autônomos e sem emissão de poluentes nocivos. A popularidade da micromobilidade entre os usuários explodiu nos últimos dois anos, e os sistemas compartilhados de bicicleta e patinetes dobraram o número de passageiros no ano passado. O crescimento no número de usuários aumentou a demanda por infraestrutura que acalme o tráfego e aumente a segurança de todas as pessoas que circulam na rua.
O ITDP recomenda que as ruas com velocidades e fluxos mais altos, como as que apresentam velocidade máxima de até 50 km/h, tenham uma ciclovia ou via segregada para micromobilidade. As ruas sem infraestrutura exclusiva para micromobilidade devem ser lentas, com um limite de velocidade máximo de 30 km/h. A infraestrutura exclusiva, como ciclovias expressas (cycle highways) e estacionamento para bicicletas e patinetes, tornam as condições mais seguras e convenientes para os usuários de micromobilidade.
À medida que a micromobilidade continua crescendo e evoluindo, as cidades precisarão apoiar esse modo com uma agenda progressista e com políticas de visão de futuro. A micromobilidade tem potencial para se tornar um meio de transporte popular, seguro e de baixo carbono, durante e depois da crise do coronavírus.