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ITDP Brasil avalia empreendimentos brasileiros de acordo com os critérios do Padrão de Qualidade TOD

O padrão de urbanização que vigora há algumas décadas no Brasil e em outras partes do mundo é uma das principais causas dos problemas de mobilidade enfrentados atualmente. Este padrão é marcado pelo espraiamento urbano (expansão horizontal da fronteira urbana), pela priorização do transporte individual motorizado (automóvel), pela segregação socioespacial e pelo desequílibrio territorial na oferta de oportunidades (especialmente de trabalho).

De fato, a partir principalmente da década de 50, por uma série de fatores políticos, econômicos e culturais, as cidades brasileiras passaram a ser planejadas para conveniência da posse e utilização do carro. Neste processo, as pessoas perderam importância no planejamento urbano, que passou a priorizar o estacionamento e a circulação de veículos motorizados. Isso ficou nítido não somente no tratamento do espaço urbano, mas também nos instrumentos legais destinados à definição do uso e da ocupação do solo e, consequentemente, nos projetos arquitetônicos.

“Isso tem levado à uma crise de mobilidade nas cidades brasileiras, com múltiplas causas“, explica Iuri Moura, mestre em Engenharia Urbana e Ambiental pela PUC-Rio e gerente de Desenvolvimento Urbano do ITDP Brasil. “Chegamos ao início do século XXI com cerca de 82% da população brasileira vivendo nas cidades, que hoje são em grande parte marcadas pela falta de integração entre políticas de transporte, uso e ocupação do solo“.

A partir da década de 90, ficou clara a insustentabilidade social, econômica e ambiental deste modelo de cidade moderna. Academia, governos locais e organizações da sociedade civil passaram a discutir alternativas, dentre elas, o conceito de Desenvolvimento Orientado ao Transporte Sustentável.

O Desenvolvimento Orientado ao Transporte Sustentável (DOTS, em tradução livre do termo original em inglês Transit Oriented Development), promove uma mobilidade urbana mais sustentável, propondo uma ocupação mais compacta, com uso misto do solo e adensamento no entorno dos transportes de média e alta capacidade. Assim, é possível encurtar distâncias a serem percorridas pelas pessoas e tornar mais conveniente e seguro caminhar, usar bicicleta ou transporte público.

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O conceito DOTS começou a ser disseminado principalmente por meio do livro The Transit Metropolis: A Global Inquiry, de Robert Cervero (1998). Cervero é PhD em planejamento urbano, professor da Universidade de Berkeley (Califórnia, EUA) e um dos principais porta-vozes da proposta. Segundo ele, uma das questões mais fascinantes do DOTS é que, de fato, não se trata de algo novo. Em estrevista dada por ele em 2012 ao periódico Berkeley Transportation Letter, Cervero afirma que na era pré-automóvel as cidades eram mais compactas, com uso misto do solo e fisicamente orientadas ao transporte público, que na época era a principal opção de mobilidade. Em muitos aspectos, o DOTS se assemelha ao resgate de um urbanismo tradicional, mais voltado à escala humana.

Em sua origem, a rua não era apenas uma área de circulação, mas também um um espaço para se estar, passar o tempo, interagir com outras pessoas. Essa lógica original das ruas como espaços públicos e de convivência está voltando à tona na última década“, resgata Danielle Hoppe, arquiteta e mestre em Planejamento Urbano pela McGill University (Montreal, Canadá), e gerente de Transportes Ativos e Gestão da Demanda por Viagens do ITDP Brasil. “São as pessoas que caminham, acessam serviços e o transporte público. Não podemos esquecer que até 2030 a perspectiva é de que 90% da população brasileira viva em cidades. Precisamos pensar em como desenhar nossas cidades para absorver esse aumento populacional e garantir a qualidade de vida das pessoas“.

Padrão de Qualidade TOD - ITDP Brasil

A implementação de projetos e políticas que promovam o conceito DOTS nas cidades é complexo, envolvendo uma série de etapas (planejamento, implementação, gestão e monitoramento) e atores sociais (poder público, iniciativa privada e sociedade civil). Para auxiliar o processo de planejamento destas iniciativas, o ITDP criou o Padrão de Qualidade TOD, que estabelece objetivos e métricas de desempenho acessíveis a um público técnico e não-técnico, dando a todos – de empreendedores imobiliários a moradores locais interessados – uma forma de entender e aplicar de forma bem sucedida o conceito DOTS.

O Padrão de Qualidade TOD deve ser utilizado na avaliação de iniciativas por meio de critérios baseados nos oito princípios de mobilidade urbana sustentável, que sintetizam o conceito DOTS. Ele não só ajuda a identificar melhores práticas em todo o mundo mas também possui uma variada gama de aplicações possíveis, como ferramenta de avaliação:

Analisar empreendimentos em fase de planejamento ou já construídos, para sugerir adequações, identificar oportunidades de melhorias e avaliar o quão eles estão orientados ao transporte sustentável;

Avaliar entornos de estações de transporte de média e alta capacidade, já existentes ou planejadas, para identificar oportunidades de desenvolvimento urbano e de novos investimentos;

Oferecer suporte para a criação ou modificação de políticas públicas, instrumentos de planejamento urbano, uso do solo e transporte.

Usando os critérios de avaliação do Padrão de Qualidade TOD, o ITDP Brasil realizou a avaliação de dois empreendimentos de grande visibilidade no Rio de Janeiro e São Paulo. Os objetivos foram o de identificar boas práticas e realizar uma análise crítica da produção imobiliária no país.

Conjunto Nacional, São Paulo

Boas práticas de DOTS no ícone da arquitetura paulistana

Ilha Pura, Rio de Janeiro

Progressos e permanências na futura cidade olímpica

As avaliações foram possíveis com base em informações públicas e/ou fornecidas pelas organizações responsáveis pela concepção, comercialização, administração ou implementação dos empreendimentos alvo da análise. Apesar de alguns princípios DOTS estarem presentes, os resultados mostram que ainda há um longo caminho a ser percorrido, principalmente, no sentido de promover acesso equitativo à oportunidades (inclusão social), a interação entre diferentes classes sociais e o desestímulo ao uso do transporte individual motorizado.

Um desenvolvimento urbano mais inclusivo é um dos objetivos centrais do DOTS e cada vez mais importante para o futuro e a sustentabilidade das cidades brasileiras. Precisamos avançar nas políticas públicas que priorizem uma distribuição mais equitativa de moradia e transporte. Só assim será possível reduzir o gigantesco passivo econômico, social e ambiental que temos em função das medidas adotadas nas últimas décadas, que estimularam o espraiamento urbano, o uso do automóvel e a desvalorização do transporte público“, complementa Iuri Moura.

O sistema de pontuação do Padrão de Qualidade TOD distribui um total de 100 pontos a 21 métricas. A distribuição dos pontos reflete quantitativamente como um empreendimento está planejado em relação ao uso do solo e se seu desenho está orientado ao transporte de média e alta capacidade, à pé ou de bicicleta. Com isso, é possível estabelecer um ranking do Padrão de Qualidade TOD, de acordo com a pontuação recebida pelo empreendimento, conforme abaixo:

Padrão Ouro
85 – 100 pontos
Projetos que são referências internacionais em Desenvolvimento Orientado ao Transporte Sustentável (DOTS).

Padrão Prata
70 – 84 pontos
Projetos cujos objetivos estão alinhados às boas práticas em Desenvolvimento Orientado ao Transporte Sustentável (DOTS).

Padrão Bronze
55 – 69 pontos
Projetos que satisfazem a maioria dos objetivos de boas práticas em Desenvolvimento Orientado ao Transporte Sustentável (DOTS).

Padrão de Qualidade TOD não é um modelo para medir a sustentabilidade de um projeto em termos gerais. Para isto, já existem disponíveis várias opções recomendáveis, tais como os sistemas LEED ND e BREEAM Communities. O padrão, por si só, não avalia sistemas de transporte de média e/ou alta capacidade, mas sim busca complementar outras avaliações e modelos, tais como o Padrão de Qualidade BRT. Apesar de incentivar o planejamento urbano que melhore a qualidade da vida, a equidade social e desenvolvimento sustentável, o Padrão de Qualidade TOD não aborda diretamente todos os aspectos envolvidos em um planejamento urbano que integre todos esses aspectos de desenho e projeto, mas sim apenas os que impactam diretamente os padrões de mobilidade das pessoas.

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