Capacitar técnicos e gestores para o planejamento cicloinclusivo e sua intersecção com a primeira infância: este foi o mote de uma série de oficinas realizadas pelo ITDP Brasil com profissionais da Prefeitura do Recife neste ano. A atividade marcou mais uma etapa da atuação do ITDP na cidade, reunindo técnicos da Secretaria de Planejamento, Gestão e Transformação Digital (SEPLAGTD) e da Autarquia de Trânsito e Transporte (CTTU). As oficinas, que aconteceram virtualmente, contaram com o apoio da Fundação Bernard Van Leer, dedicada a promover o fortalecimento e ampliação de políticas e iniciativas que melhorem a vida de crianças pequenas e suas famílias.
A jornada começou com uma palestra, que apresentou conceitos e diretrizes para integrar o planejamento cicloviário às necessidades da primeira infância. A atividade seguiu com dois dias de mão na massa, em um exercício de formulação de propostas para trechos da rede cicloviária do Recife. As soluções de projeto desenvolvidas durante a oficina continuaram a ser detalhadas pela equipe da CTTU nos meses seguintes e devem ser implantadas em breve, contemplando as necessidades da primeira infância.
“As oficinas abriram o olhar da equipe para as crianças e seus cuidadores. Em geral, quando projetamos a infraestrutura cicloviária, temos em mente uma pessoa genérica, mas este perfil não atende as necessidades de muitos dos usuários reais. Pensar a cidade sob o olhar da primeira infância é fundamental para construirmos uma cidade realmente inclusiva, e as oficinas foram muito úteis para fortalecer esse entendimento.”, afirma Taciana Ferreira, Diretora Presidente da CTTU.
O Recife tem dado passos importantes para melhorar as condições de mobilidade por bicicletas, ao mesmo tempo em que consolida e expande as políticas dedicadas à primeira infância. A cidade foi a primeira parceira do programa Urban 95 no Brasil, iniciativa da Fundação Bernard Van Leer que busca inserir o olhar da primeira infância nas políticas públicas, tendo aprovado um Plano Municipal de Primeira Infância em 2020. A cidade vem realizando diversas iniciativas de melhorias no espaço público, além de aumentar a oferta de serviços e atividades para cuidadores e crianças pequenas em diversos programas e equipamentos públicos.
Na área da mobilidade por bicicletas, o Recife é uma das cidades participantes da campanha Cidades Pedaláveis, do ITDP, que irá promover o intercâmbio de experiências entre as administrações municipais e oferecer apoio técnico para a expansão das redes cicloviárias. A meta global da campanha é fazer com que as cidades participantes implementem infraestrutura cicloviária que permita o acesso de 25 milhões de habitantes a redes conectadas de ciclovias e ciclofaixas até 2025. “Esperamos trocar experiências com outras cidades para fortalecer e aprimorar as políticas em curso aqui no Recife. Muitas cidades vivem realidades parecidas, afinal depois de décadas de incentivo à cultura do carro, este modo de transporte está perdendo o espaço, dando lugar a alternativas como a bicicleta”, afirma Taciana.
Redes de articulação e instâncias participativas
O ITDP Brasil tem apoiado o desenvolvimento de políticas de mobilidade sustentável no Recife desde o final de 2016, com a participação no Fórum Popular de Mobilidade do Recife, um embrião da RAMO – Rede de Articulação pela Mobilidade. A RAMO articulou diversas organizações locais e nacionais, motivadas inicialmente pela discussão sobre a tarifa do transporte coletivo e, em seguida, por outras pautas, incluindo o Plano de Mobilidade Urbana que estava sendo elaborado pelo governo estadual. A RAMO conseguiu impedir o aumento da tarifa do transporte coletivo em 2018 e, a partir da articulação dos diversos grupos participantes, ampliou a discussão sobre a mobilidade urbana na cidade.
Em 2017, a partir da assinatura de um termo de cooperação, o ITDP apoiou o governo do Estado de Pernambuco na reativação do Escritório da Bicicleta, grupo de gestão participativa do Plano Diretor Cicloviário (PDC), responsável por coordenar a implantação entre os 14 municípios da Região Metropolitana do Recife. O ITDP participou das discussões sobre a expansão da rede cicloviária e ofereceu apoio técnico para o desenvolvimento de um novo edital para o sistema de bicicletas compartilhadas, o BikePE.
O PDC foi publicado em 2014 com a proposta de criar uma rede cicloviária metropolitana (sob responsabilidade do Estado) e redes complementares em todos os municípios da região (sob responsabilidade das prefeituras). O plano possui um horizonte de implantação de 10 anos, ou seja, até 2024. Até o momento, a prefeitura do Recife implantou cerca de 70% dos trechos previstos no PDC sob sua responsabilidade (rede complementar) e a malha cicloviária alcançou 159km de extensão em setembro de 2021. Além de expandir a rede complementar, a cidade também está realizando estudos para os traçados da rede metropolitana, composta de obras mais caras e complexas.
Indicadores e ciclovias emergenciais
Em 2018, o ITDP Brasil realizou oficinas em 4 cidades brasileiras para aprimorar sua plataforma de indicadores, a MobiliDADOS, lançada no ano anterior. Desta vez a parceria foi estabelecida com a sociedade civil. A Associação Metropolitana dos Ciclistas Urbanos do Recife (Ameciclo) contribuiu com as discussões que resultaram em novos indicadores, entre eles a medição do potencial de acesso à rede cicloviária (PNB) e o recorte por renda, gênero e raça. Em 2021, a plataforma MobiliDADOS aponta que a rede cicloviária do Recife está próxima a 26% da população, ou seja, esta é a parcela das pessoas que dispõem de uma estrutura cicloviária a menos de 300 metros de sua residência. Entre as nove capitais brasileiras monitoradas na plataforma, a cidade fica em quarta colocação, atrás de Fortaleza, onde 47% da população dispõe de infraestrutura cicloviária a menos de 300 metros de sua residência, Belém, onde o percentual alcança 31% e Brasília, com 28%.
Durante a pandemia de COVID-19 diversas cidades aproveitaram o espaço ocioso resultante da redução das viagens urbanas para implementar as chamadas “ciclovias emergenciais”. No primeiro semestre de 2020, em parceria com a Ameciclo, o ITDP desenvolveu cenários para avaliar o impacto de ciclovias emergenciais na cidade em termos de proximidade. A implantação de ciclovias emergenciais em todas as rotas previstas pelo PDC aumentaria de 26% para 35% a população atendida pela rede cicloviária, além de aumentar de 37% para 55% o acesso aos postos de trabalho, e de 52% para 79% o atendimento das estações do BikePE.
Aproximar a população das redes cicloviárias é a meta da campanha Cidades Pedaláveis, que foi lançada no último dia 9 de novembro. Os cenários desenvolvidos para as ciclovias emergenciais do Recife, bem como a expansão da rede cicloviária permanente, demonstram o potencial da cidade em oferecer infraestrutura segura e confortável para seus cidadãos. Mais infraestrutura significa mais pessoas usando bicicletas para seus deslocamentos cotidianos e, com isso, menor emissão de poluentes locais e de gases de efeito estufa, melhor qualidade de vida e uma mobilidade urbana mais justa e eficiente.